terça-feira, 13 de setembro de 2016

CUNHA É CASSADO E CULPA TEMER

Eduardo Cunha, fazendo a própria defesa
Responsável direto pelo processo de impeachment que feriu a democracia brasileira e levou Michel Temer ao poder, Eduardo Cunha foi cassado por 450 votos, na madrugada desta-segunda-feira (12), e enfrentou a traição de muitos parlamentares que ajudou financeiramente; na queda, ele apontou o dedo para o governo Temer; "E aí eu culpo o governo hoje, não porque o governo tenha feito nada para me cassar, mas quando o governo patrocinou a candidatura do presidente que se elegeu em acordo com o PT, o governo, de uma certa forma, aderiu à agenda da minha cassação", disse ele; teme-se, em Brasília, que Cunha feche uma delação premiada e delate centenas de deputados, senadores, ministros e o próprio Temer, de quem sempre foi muito próximo.

Cassado por 450 deputados nesta madrugada, Eduardo Cunha perdeu os direitos políticos e o foro privilegiado, podendo ser preso a qualquer momento por seu envolvimento na Operação Lava Jato.

Na queda, ele culpou o governo de Michel Temer e poderá agora delatar centenas de deputados, senadores e ministros, além do próprio presidente (leia aqui previsão da consultoria Eurasia a respeito).

Abaixo, reportagem da Reuters sobre a queda de Cunha:

Por Maria Carolina Marcello

BRASÍLIA (Reuters) - O ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ) teve seu mandato cassado nos últimos minutos da segunda-feira, marcando o fim de uma força política que detonou o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, e, sem sair da linha polêmica que vinha seguindo, caiu atirando e apontou o governo de Michel Temer como um dos culpados pela perda do mandato.

Para ele, o resultado com larga vantagem para sua cassação – 450 votos favoráveis, 10 contra e 9 abstenções, foi fruto de uma conjuntura que reuniu a articulação do governo e a proximidade das eleições municipais, além de ter sido alimentado por um desejo de "vingança" nutrido por aliados de Dilma.

"É o conjunto político, do processo de vingança, da conjuntura. E aí eu culpo o governo hoje, não porque o governo tenha feito nada para me cassar, mas quando o governo patrocinou a candidatura do presidente que se elegeu em acordo com o PT, o governo, de uma certa forma, aderiu à agenda da minha cassação", disse.

Cunha refere-se à eleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ) ao comando da Casa, candidatura que contou com o apoio de aliados de Dilma justamente por ser a mais competitiva em contraposição ao candidato mais identificado com Cunha.

"Eu disse que o governo é culpado quando fez o patrocínio, porque quem elegeu o presidente da Casa foi o governo, quem derrotou o candidato Rogério Rosso (PSD-DF) foi o governo", afirmou, negando no entanto, que seja de seu feitio fazer ameaças.

A cassação de Cunha marca o fim, ao menos por ora, de sua carreira política, já que com a Lei da Ficha Limpa a perda do mandato o deixa inelegível por oito anos, mas não encerra a controvérsia que cerca o deputado. Cresce agora, no ambiente político, o temor que faça uma delação premiada no âmbito da Lava Jato, podendo envolver integrantes do atual governo.

Questionado por jornalistas se faria este tipo de acordo, Cunha afirmou que apenas criminosos fazem delação e, como segundo disse, não cometeu crimes, não tem o que delatar. 

DE LÍDER DO CENTRÃO A CASSADO

Cunha saiu de um contexto em que era uma das principais lideranças políticas do Congresso para uma situação de debandada de aliados. Antes, no tempo em que presidiu a Câmara entre 2015 e 2016, reuniu um grupo de parlamentares da base do governo Dilma que sob seu comando impôs derrotas importantes em votações caras ao Palácio do Planalto.

O grupo de mais de 200 parlamentares tornou-se uma tropa capaz de prolongar a tramitação do processo de cassação por quebra de decoro parlamentar que Cunha sofreu sob a acusação de ter mentido quando depôs espontaneamente à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras.

Na ocasião, negou ter contas no exterior, mas documentos dos Ministérios Públicos da Suíça e do Brasil apontaram a existência de contas dele e de familiares no país europeu.

Ainda assim, Cunha mantinha sua força política junto ao grupo de mais de 200 parlamentares e ganhou especial interesse de integrantes da oposição a Dilma, que viam no deputado a chance de levar adiante um impeachment da então presidente.

Passou a ver sua força diminuir quando o Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou denúncia e o transformou em réu, em março deste ano. Depois, em maio, o STF determinou seu afastamento do cargo de presidente da Câmara e a suspensão de seu mandato. Em junho, o deputado tornou-se réu em uma segunda ação penal.

Não bastassem os reveses jurídicos, Cunha passou a perder aliados no campo político. Uma vez efetivado o impedimento de Dilma, passou a sofrer críticas duras da oposição à petista.

A situação chegou ao ponto de aliados aconselharem-no publicamente a renunciar antes que o Conselho de Ética aprovasse um parecer pela cassação. Perdeu o timing, e, em seu último discurso antes da votação que cassou seu mandato, pediu que os colegas votassem não pelo conjunto da obra, mas pelas acusações específicas que recaem sobre ele.

Em sua defesa, adotou uma postura de ataque e disse ser vítima de vingança por ter aceito o pedido de abertura de processo de impeachment, além de afirmar que recebeu tratamento diferenciado por parte da Justiça.

"É só por vingança", declarou da tribuna, pouco antes da votação que selou seu destino político. "Alguém tem dúvida que se não fosse a minha atuação teria aquele processo de impeachment?", questionou.

"Estou pagando o preço de ter o meu mandato cassado por ter dado continuidade do processo de impeachment... é o preço que estou pagando para o Brasil ficar livre do PT."

O PROCESSO

A representação que deu origem a processo de cassação foi apresentada em outubro do ano passado pelo PSOL e pela Rede, além de ter sido assinada por deputados de outros partidos, muitos deles do PT, a partir de denúncias da existência de contas bancárias secretas na Suíça de Cunha e de familiares.

Após muitas idas e vindas, o Conselho de Ética aprovou, em junho, o parecer do deputado Marcos Rogério (DEM-RO), pela cassação do mandato do parlamentar.

Aliados, já mais esparsos, tentaram recorrer à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, sem sucesso, e também lançaram mão de prerrogativas do regimento para tentar amenizar a pena do deputado.

Chegaram a aventar a possibilidade de, a exemplo do que foi feito na votação que cassou o mandato de Dilma mas manteve seus direitos políticos, fatiar a votação.

O deputado Carlos Marun (PMDB-MS), por exemplo, apresentou questão de ordem defendendo que pudesse ser colocado em votação não o parecer de Rogério pela cassação, mas um projeto de resolução, passível de ser emendado --comportando, inclusive, uma pena mais branda a Cunha.

Mas apesar do empenho de Marun, e da iniciativa do próprio Cunha de procurar pessoalmente vários deputados, pedindo que não dessem quórum na sessão desta segunda-feira, a proximidade das eleições municipais e a pressão popular não deixaram muita margem para outro resultado que não a cassação.

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